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FARMACOLOGIA HUMANA DA HOASCA

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FARMACOLOGIA HUMANA DA HOASCA, PLANTA ALUCINÓGENA USADA EM CONTEXTO RITUAL NO BRASIL

CHARLES S. GROB, M.D., (1) DENNIS J. McKENNA, Ph.D., (2)JAMES C. CALLAWAY, Ph. D.,(3) GLACUS S. BRITO, M.D.,(4)EDISON S. NEVES, M.D., (4), GUILHERME OBERLAENDER, M.D.,(4)

OSWALDO L. SAIDE, M.D.,(5) ELISEU LABIGALINI, M.D.,(6)CRISTIANE TACLA, Ph.D.,(6) CLAUDIO T. MIRANDA, M.D., (6) RICKJ. STRASSMAN, M.D.,(7) AND KYLE B. BOONE, Ph. D. (1)

(1) Department of Psychiatry, Harbor-UCLA Medical Center, Box498, 1000 West Caeson

Street, Torrance, California, USA, 90509. Send reprint requests to Dr. Grob.

(2) Botanical Dimensions, Occidental, California, USA.

(3) Department of Pharmacology and Toxicology, University of Kuopio, Finland.

(4) Centro de Estudos Médicos. Rua Caiubi, 1004 - Perdizes - São Paulo-SP, Brasil. CEP:

05010-000. FF (011) 2638298.

(5) Departamento de Psiquiatria, Universidade Estadual do Rio de janeiro, Brasil.

(6) Departamento de Psiquiatria, Escola Paulista de Medicina, São Paulo, Brasil.

(7) Department of Psychiatry, University of New Mexico, Albuquerque, New Mexico.

Os autores agradecem o auxílio da Heffter Research Institute, Botanical Dimensions e

Jeffrey Bronfman.

Resumo:

Uma investigação biomédica em cooperação multinacional dos efeitos da

hoasca (ayahuasca), uma potente decocção de plantas alucinógenas, foi

conduzida na Amazônia brasileira durante o verão de l993. Esta comunicação

descreve os achados psicológicos de membros filiados há 15 anos de uma

religião sincrética que utiliza a hoasca legalmente como sacramento, assim como

de l5 indivíduos-controle sem história anterior de ingestão da hoasca. Avaliações

administradas a ambos os grupos incluiram entrevistas para diagnóstico

psiquiátrico estruturado, teste de personalidade e avaliação neuropsicológica.

Achados fenomenológicos dos estados alterados de conscicência, bem como

entrevistas semi-estruturadas e abertas de histórias de vida foram conduzidas

com o primeiro grupo, mas não com o grupo controle.

Achados significativos incluiram a remissão de psicopatologia após início

do uso da hoasca, sem evidência de deterioração da personalidade ou cognitiva.

Avaliação global revelou status funcional elevado. atribuido pelos indivíduos ao

uso ritual do seu sacramento psicoativo, hoasca. Implicações deste fenômeno não

usual e necessidade de investigação futura são discutidas.

J. Nerv Ment Dis 184:86-94, 1996

Hoasca é uma decocção alucinógena de plantas psicoativas potentes,

indígenas, provenientes da Bacia Amazônica, na América do Sul. É conhecida 2

por vários nomes, incluindo ayahuasca, caapi, yage, mihi, dapa, natema, pinde,

daime e vegetal. Hoasca é a tradução para o português de ayahuasca, termo

utilizado em todo o Brasil. Anterior à conquista européia, dominação e aculturação

da América do Sul, iniciada no século XVI , a hoasca foi largamente utilizada

pelos nativos em rituais com propósitos mágicos e religiosos, presságios, bruxaria

e tratamento de doenças (Dobkin de Rios, 1972). Apesar das prolongadas e

selvagens tentativas dos conquistadores europeus de reprimir e erradicar a cultura

nativa e seus sistemas de crença (Taussig, 1986), o uso medicinal e sacramental

da hoasca continuou presente.

O estudo científico da hoasca começou com o renomado botânico inglês

Richard Spruce, que, de 1849 a 1864, viajou intensamente através da Amazônia

brasileira, vezenuelana e equatoriana, para montar um inventário da variedade de

espécies de plantas lá encontradas ( Schultes and Raffauf, 1992). Spruce fez

grande número de descobertas valiosas, incluindo Hevea, os gens da Seringueira

e Cinchona da qual o quinino é derivado. Identificou também que uma das fontes

primárias de uma poderosa destilaria de alucinógenos usada por indíos Mazan e

Zaparo chamada ayahuasca (“vinho das almas “ ou “vinho dos mortos”, Quechua),

e anteriormente descrita pelo equatoriano Manoel Villavicencio (1858), era um

comprido cipó, ao qual mais tarde seria dada a designação botânica formal de

Banisteriopsis caapi (Spruce, 1908; Ott, 1994). Análises laboratoriais

subsequentes iriam revelar a presença dos alcalóides beta-carbolina, harmina,

harmalina e tetrahydroharmina, psicoativos, que quando primeiramente isolados,

no começo do século XX, receberam a exótica denominação de Telepatina.

Conforme identificado pelos primeiros observadores de campo do uso da hoasca,

outras misturas psicoativas eram frequentemente adicionadas ao cozimento das

preparações do Banisteriopsis caapi, principalmente plantas contendo a

altamente potente e alucinogênica triptamina, incluindo tais plantas indutoras de

visões, como a Psychotria viridis ( McKenna e Towers, 1984).

Através de toda a Bacia Amazônica, o uso do hoasca permaneceu tão

enraizado na mitologia e filosofia tribal, que investigadores modernos

confidencialmente concluem que seu uso se estende aos primeiros habitantes

aborígenes daquela região (Schultes and Hofmann, 1992). Eles têm documentado

a tradição do uso da hoasca pelo povo indígena da região como tendo o propósito

de libertar a alma do confinamento do corpo e facilitar o acesso aos reinos de

realidade alternativa, permitindo assim uma variedade de experiências mágicas,

incluindo o acesso à comunicação com os espíritos ancestrais. Antropólogos que

têm realizado estudos etnográficos dos habitantes nativos da Bacia Amazônica

descrevem fenômenos comumente induzidos pela hoasca, como visões de

jaguar, cobras e outros animais predatórios, visões de pessoas distantes, cidades

e paisagens, a sensação de “ ver ” o entrelaçamento detalhado de

acontecimentos misteriosos recentes e a sensação de contato com o

sobrenatural (Harner, 1973).

A hoasca, como é o caso de outras plantas alucinógenas, tem uma tradição

pré-histórica de uso por povos aborígenas nativos, como sacramentos

shamânicos ou catalizadores (Furst, 1976; Bravo and Grob, 1989). É considerado

um grande “medicamento” , usado tanto no diagnóstico como no tratamento de

doenças (Schultes and Hofmann, 1992). Seu uso é amplamente sancionado pelos 3

costumes sociais e leis, e, de fato, é a experiência central sobre a qual se apóia a

consciência coletiva e tribal. A utilização de tais plantas alucinógenas potentes

como a hoasca, tipicamente ocorre dentro de um contexto ritualizado, incluindo os

ritos tradicionais de iniciação (Grob and Dobkin de Rios, 1992). Os poderosos

efeitos de hipersugestibilidade induzidos pela planta alucinogênica, reforça

sistemas coletivos de crença, fortifica coesão de grupos e facilita visões sintônicas

e culturalmente condicionadas, as quais proporcionam revelação, bênçãos, cura e

segurança ontológica (Dobkin de Rios and Grob, 1994).

O uso da hoasca para propósitos de cura e sustentação religiosa, durante

os séculos de aculturação européia da Amazônia, emergiu de domínios

exclusivamente tribais da floresta tropical e tem sido incorporado na estruturação

da sociedade rural e urbana contemporânea, particularmente entre a população

de mestiços indígenas do Peru, Colômbia e Equador. Identificada como um auxílio

valioso em práticas populares de cura, a hoasca é ritualmente administrada pelos

“ayahuasqueros” para grupos cuidadosamente selecionados de pacientes (De

Rios, 1972). Aderindo-se integralmente aos modelos shamânicos praticados pelos

povos aborígenes, esses curadores do povo empregam similarmente a

sacramental hoasca com objetivo de diagnóstico e cura, presságios e como um

caminho de acesso aos reinos do sobrenatural.

Durante o século XX, o uso do hoasca tem crescido dentro do contexto de

movimentos religiosos sincréticos modernos, particularmente no Brasil .Uma

destas “igrejas”, objeto deste estudo, é a União do Vegetal (UDV). A origem da

UDV ocorreu no começo dos anos 50, quando seu fundador, José Gabriel da

Costa, um seringueiro que primeiramente experimentou os efeitos da hoasca com

os índios nativos da Bolívia, retornou a Porto Velho

1

, cidade da Amazônia

brasileira em rápida expansão, com suas visões de revelação espiritual e missão

pessoal. Reunindo um grupo de seguidores leais, Mestre Gabriel, como ele veio a

ser conhecido, elaborou uma mitologia e uma estrutura para sua nova religião.

Espalhando-se primeiramente através da Amazônia brasileira, e depois para o

populoso e urbanizado Sul, a UDV cresceu, nas subsequentes quatro décadas,

para atingir o tamanho atual de aproximadamente 7 .000 membros espalhados

por todo o Brasil, com adeptos por todo o espectro sócio-econômico e

profissional. Organizados na linha da antiga paróquia cristã, os núcleos são

centros onde a hoasca sacramental é consumida em longas cerimônias rituais

realizadas duas vezes por mês, dirigidas por mestres locais, líderes da seita

religiosa. Embora não seja a única religião sincrética brasileira a usar a hoasca

como sacramento ritual (o culto do Santo Daime sendo maior e mais amplamente

conhecido), a UDV tem a mais forte estrutura organizacional, assim como a mais

disciplinada irmandade. De todas as igrejas hoasqueiras no Brasil, a UDV foi

também a mais ativa em convencer o Conselho Federal de Entorpecentes

(Confen) a remover a hoasca da lista de drogas banidas, o que foi obtido, em

1987, para uso em contexto cerimonial religioso.

Embora alcançando alguma atenção e notoriedade na literatura norte

americana e na imprensa popular, notadamente os trabalhos de William

 

1 N. T.: Corrigido do original, onde consta Rio Branco e não Porto Velho como cidade

de origem da UDV, com autorização do autor.4

Burroughs e Allen Ginsberg (Burroughs and Ginsberg, 1963), o fenômeno

psicológico induzido pela hoasca tem sido sujeito a estudos virtualmente não

rigorosos. Vários viajantes da Bacia Amazônica têm documentado suas primeiras

experiências com a hoasca (Weil, 1980), enquanto tanto narrativas antropológicas

formais como informais têm excitado a imaginação do público (Lamb, 1971; Luna

and Amaringo, 1991). De fato, o interesse nas tradicões exóticas da Amazônia e

efeitos da hoasca, criou uma corrente constante de turistas americanos,

frequentemente atraídos por artigos e propagandas em revistas populares e “New

Age” (Krajick, 1992; Ott, 1993). Considerações sobre possíveis efeitos

psicológicos adversos à saúde incorridos em viajantes estrangeiros, têm também

sido ressaltados por uma conhecida autoridade em antropologia do uso do chá na

Amazônia (Dobkin de Rios, l994). Para confronto com os testemunhos quanto à

melhora do funcionameto psicológico e moral dos adeptos das igrejas sincréticas

da hoasca no Brasil, um estudo formal explorando os efeitos de longo uso desta

bebida alucinogênica incomum parece indicado.

Durante o verão de 1993, um grupo mutinacional de pesquisadores

biomédicos, dos Estados Unidos, Finlândia e Brasil encontrou-se em Manaus,

capital do Amazonas, para conduzir um exame dos efeitos bioquímicos e

psicológicos da hoasca. Anteriormente à realização do estudo, um convite foi

feito pela União do Vegetal, para uma investigação da toxicidade do “chá ”

hoasca. Dada a longa história de repressão do seu movimento religioso e do uso

sacramental da hoasca anterior à sanção governamental em 1987, os líderes da

UDV consideraram que conclusões de um estudo científico, objetivo e isento,

poderiam ter um valor de proteção no futuro, se mudasse a direção política no

Brasil. Consequentemente, após consulta ao grupo de pesquisa norte americana,

foi tomada a decisão de utilizar o núcleo mais antigo fora de Porto Velho, em

Manaus, onde uma grande porcentagem dos membros vinham consumindo a

hoasca nos rituais, regularmente, por mais de 10 anos. Dadas as exigências e

complicada logística colocadas aos sujeitos neste estudo, a firme e organizada

estrutura da UDV e a disciplina de seus membros provaram ser inestimáveis para

o sucesso no cumprimento da meta do projeto. A parte I deste documento irá

detalhar os resultados da nossa investigaçao dos efeitos do chá hoasca nas

funções psicológicas e a parte II, irá discutir nosso exame dos efeitos da hoasca

na bioquímica humana.

MÉTODOS

Quinze membros da igreja sincrética União do Vegetal, vivendo na cidade

de Manaus, foram selecionados aleatoriamente de um grande grupo de

voluntários. O critério para inclusão no estudo incluiu filiação à UDV por pelo

menos dez anos. Membros da UDV participam nos rituais utilizando a hoasca

como sacramento psicoativo num mínimo de duas vezes por mês, mas,

frequentemente, várias vezes por semana, porém, sempre num contexto ritual.

Em acréscimo à participação regular no consumo cerimonial da hoasca, a UDV

requer dos membros completa abstinência de todas as outras substâncias

psicoativas, incluindo o álcool, tabaco, maconha, cocaina e anfetaminas. 5

Quinze sujeitos de controle que nunca tinham consumido a hoasca, foram

também recrutados com o objetivo de compará-los em todos os parâmetros

demográficos. Por causa do tamanho relativamente pequeno da amostra e da

necessidade de limitar o número de variáveis, todos os indivíduos da UDV

submetidos à experimentação e os de controle foram homens. Os examinandos

de controle foram comparados aos outros nos parâmetros de idade, etnicidade,

estado marital e nível de instrução. Embora tenham sido feitas tentativas de

controle da dieta e do consumo de álcool, completa garantia não foi possível. Por

causa das condições difíceis de campo, assim como das limitações de tempo, não

foi possível analisar completamente todos os dados demográficos até o início do

estudo. Naquela época foi notado que os indivíduos de controle tinham

significativamente uma renda anual maior do que os outros examinandos. Num

empenho de explicar esta diferença notamos que o método de recrutamento dos

indivíduos de controle fora pedir a cada um dos examinandos da UDV que levasse

para o estudo, um amigo próximo ou alguém que nunca tivesse participado de

uma sessão da UDV e nem consumido o chá em nenhuma outra circunstância.

Foi notado em retrospecto que vários examinandos pediram aos supervisores em

seus locais de trabalho para serem voluntários para o estudo.

Vários parâmetros foram utilizados para avaliar os níveis no passado e

atuais das funções psicológicas. A ambos os grupos de experimentação foram

aplicadas entrevistas estruturadas de dignóstico psiquiátrico (Composite

International Diagnostic Interview -CIDI ), teste de personalidade (Tridemensional

Personality Questionnaire-TPQ ) e teste neuropsicológico (WHO-UCLA Auditory

Verbal Learning Test). Aos examinandos da UDV mas não aos de controle foi

pedido para preencher um questionário (Hallucinogen Rating Scale -HRS) após

uma sessão de hoasca. Cada um dos examinandos foi entrevistado também num

formato semi-estruturado destinado a verificar suas histórias de vida.

Todos os examinandos eram monolinguísticos de português. Versões em

português do Composite Internacional Diagnostics Interview (CIDI) e do

Tridimensional Personality Questionnaire(TPQ) estavam à disposição do estudo,

tendo sido previamente traduzidos e validados em português pelos criadores dos

instrumentos.Versões em português do WHO-UCLA Auditory Verbal Learning

Test e a Hallucinogen Rating Scale foram desenvolvidas para este estudo por

colaboradores brasileiros que traduziram os instrumentos primeiramente em

português, depois de volta para o inglês e, finalmente, de novo para o português.

As sessões do CIDI e o WHO-UCLA foram conduzidas por colaboradores

brasileiros, profissionais de saúde mental devidamente instruidos. O TPQ e o

HRS são questionários pessoais. As entrevistas semi-estruturadas da história de

vida foram conduzidas por um psiquiatra de língua inglesa, assistido por um

intérprete fluente em inglês e português.Todas as entrevistas das histórias de vida

foram gravadas em fita.

Composite International Diagnostic Interview

O CIDI é uma entrevista padrão de diagnóstico, abrangente, para

avaliação de desordem mental de acordo com as definições e critérios do CID-10 6

e DSM-III-R (Robbins et al, 1988). O CIDI foi concebido para uso numa variedade

de culturas e ambientes. Embora sua aplicação primária tenha sido feita em

estudos epidemiológicos de desordens mentais, o CIDI tem sido também utilizado

com propósitos clínicos e de pesquisa. No curso de seu desenvolvimento o CIDI

foi submetido a uma variedade de testes em diferentes ambientes, paises e

culturas para verificar viabilidade, abrangência de diagnóstico, confiabilidade,

inclusive de procedimento (Witttchen et al, 1989).

Tridimensional Personality Questionnaire

O TPQ é um teste de 100 itens, auto-administrável, do tipo papel e lápis,

verdadeiro/ falso, um instrumento que leva aproximadamente 15 minutos para se

completar (Cloninger, 1987a). O questionário mede as três mais altas dimensões

da personalidade (Novelty Seeking, Harm Avoidance e Reward Dependence),

cada uma das quais medindo quatro dimensões menores (Cloninger, 1987 b).O

domínio da Novelty Seeking mede os espectros da excitabilidade exploratória

versus rigidez estóica ( 9 itens), impulsividade versus reflexão (8 itens),

extravagância versus reserva (7 itens) e desordem versus regimentação (10

itens).O domínio da Harm Avoidance mede os espectros de preocupação

antecipatória versus otimismo não inibido (10 itens), medo da incerteza versus

confiança ( 7 itens), timidez com estranhos versus espírito gregário (7 itens) e

fatigabilidade e astenia versus vigor (10 itens). O domínio da Reward Dependence

mede os espectros de sentimentalidade versus insensibilidade ( 5 itens),

persistência versus irresolutividade ( 9 itens ), fixação versus desapego (11 itens)

e dependência versus independência ( 5 itens ). O TPQ é baseado num modelo

biosocial unificado de personalidade, integrando conceitos focalizados em bases

neuroanatômicas e neurofisiológicas de tendências de comportamento, estilos de

aprendizado e interação adptativa das três dimensões de personalidade

(Cloninger et al, 1991).

WHO-UCLA Auditory Verbal Learning Test

O Auditory Verbal Learning Test é somente uma simples lista-tarefa de

aprendizagem similar ao Rey Auditory Verbal Learning Test (Rey, 1964), mas que

é apropriado para uso em contextos de cruzamento cultural e é sensivel a graus

moderados de disfunção cognitiva. O teste inclui uma lista de itens

cuidadosamente selecionados de categorias como: partes do corpo, ferramentas,

objetos de casa e veículos de transporte comum, de modo a ser familiar às várias

culturas (Maj et al, 1993). Aos examinandos é lida uma lista de quinze itens numa

velocidade de aproximadamente uma palavra por segundo e a seguir lhes é

pedido para repetir a maior quantidade de palavras que eles possam lembrar. A

mesma lista é lida para os examinandos num total de cinco vezes sucessivas, e

em cada ocasião os sujeitos são solicitados a repetir quantas palavras possam

lembrar. Segue-se um teste de interferência onde são lidas quinze palavras de

uma segunda lista, sendo solicitado aos sujeitos que repitam quantas palavras 7

puderem lembrar desta mesma lista, após o que lhes é novamente pedido para

repetir quantas palavras conseguirem da lista original. Para o ultimo teste, é lida

uma lista de 30 palavras, metade das quais (em ordem aleatória) são da lista

original. Então os examinandos são solicitados a indicar depois de cada palavra

se a reconhecem como parte da lista original de quinze palavras.

Hallucinogen Rating Scale

O HRS é um questionário de 126 itens originalmente desenvolvidos para

avaliar a extensão dos efeitos induzidos por administração intravenosa de

dimethyltryptamina sintética (Strassman et al, 1994).Uma escala de zero a quatro

é utlizada para a maioria das questões, como 0, “não mesmo”; 1, “muito pouco”; 2,

“moderadamente”; 3, “bastante” e 4, “extremamente”. As respostas aos itens são

analisadas de acordo com seis agrupamentos conceitualmente coerentes:

cenestesia (enteroceptivo, visceral e cutâneo - efeitos táteis); afetos (emocional

/respostas afetivas); percepção (experiências visuais, auditivas, gustativas e

olfativas); cognição (alterações em processos ou conteúdos do pensamento);

volição (uma mudança na capacidade para interagir consigo mesmo, com o

ambiente ou certos aspectos da experiência) e intensidade (vigor dos vários

aspectos da experiência).

Entrevista da História de Vida

Cada um dos quinze examinandos concordou em se submeter a uma

entrevista de aproximadamente uma hora, conduzida por um psiquiatra (CSG). A

entrevista visava explorar várias facetas de suas vidas, relacionadas à experiência

como membros da União do Vegetal e sua frequente participação nos rituais,

utilizando a psicoativa hoasca como sacramento. As entrevistas foram conduzidas

com o auxílio de um tradutor, de maneira semi-estruturada e aberta no final. A

cada um dos examinandos foi pedido para “contar a história de sua vida antes da

primeira vez em que bebeu o chá hoasca... como primeiro conheceu a UDV e os

efeitos do chá hoasca... como sua vida vem se desenvolvendo desde o momento

em que se tornou membro da UDV.

RESULTADOS

Diagnóstico Psiquiátrico

Uma entrevista psiquiátrica estruturada foi conduzida com cada um dos 15

examinandos da UDV e os de controle. A administração da Composite

International Diagnostic Interview (CIDI) identificou que apesar de nenhum dos

examinandos da UDV ter um diagnóstico psiquiátrico atual, diagnósticos por

abuso de álcool e hipocondria foram detectados em dois examinandos de

controle. Entretanto, achado de diagnóstico psiquiátrico no passado (embora não 8

mais ativo), indicou que de acordo com os critérios do CID-10 e DSM-III-R, cinco

dos examinandos tinham antecedentes de desordens formais por abuso de álcool,

dois de depressão maior e três de ansiedade fóbica. Por outro lado, entre os 15

examinandos de controle, somente um tinha passado de desordem psiquiátrica

por abuso de álcool, remitida dois anos antes do estudo.

Teste de Personalidade

O Tridimensional Personality Questionnaire (TPQ), medindo os três

domínios (Novelty Seeking, Harm Avoidance e Reward Dependence), foi

administrado aos 15 examinandos da UDV e aos l5 examinandos de controle.

Medidas e desvios-padrão e resultados comparativos do t-teste são mostrados na

Tabela I. Achados significativos no Novelty Seeking, incluiram os membros da

UDV como tendo maior “rigidez estóica versus excitabilidade exploratória”

(p<0.049) e maior “regimentação versus desordem ” (p<0.016).Uma tendência de

diferenciação entre os grupos foi encontrada no espectro de maior “reflexão

versus impulsividade”(p<0.1). Não foi encontrada variação significativa no

espectro de “reserva versus extravagância”(p<0.514). A somatória dos quatro

espectros do Novelty Seeking identificou diferenças altamente significativas entre

os dois grupos (p<0.0054).

Análises do domínio de Harm Avoidance do TPQ também identificaram

diferenças significativas entre os dois grupos. Os examinandos da UDV foram

identificados como tendo significativa maior “confiança versus medo da

incerteza”(p<0.043), com uma tendência a maior “espírito gregário versus timidez

com estranhos”(p<0.067) e maior “otimismo desinibido versus preocupação

antecipatória”(p<0.098). A somatória dos quatro espectros do Harm Avoidance

mostrou uma diferença significativa entre os dois grupos (p<0.011).

A análise do Reward Dependence não demonstrou qualquer diferença

entre os dois grupos, nem quanto ao valor total nem quanto ao valor dos subdomínios.

 

Testes Neusopsicológicos

A todos os 15 examinandos da UDV e os de controle foi administrado o

WHO-UCLA ( Auditory Learning Verbal Memory Test). Os examinandos da UDV

apresentaram desempenho significativamente melhor do que os de controle

quanto à capacidade de lembrar as palavras na quinta tentativa (p<0.038). Os

examinandos da UDV tiveram um desempenho melhor que os de controle,

embora num grau não significativo estatisticamente, nos seguintes testes: número

de palavras lembradas (p<0.253), recordação tardia (p<0.248) e recordação de

palavras após interferência (p<0.158). Não ocorreu diferença entre os dois grupos

no teste envolvendo o número de erros falsos/ positivos na tarefa de

reconhecimento (p<0.602).

Avaliação Fenomenológica 9

O Hallucinogen Rating Scale (HRS), foi completado por cada um dos 15

examinandos da UDV na hora seguinte ao término de uma sessão experimental

de hoasca, onde uma variedade de parâmetros médicos e bioquímicos tinham

sido avaliados. As análises dos 126 itens do HRS renderam achados colocando a

experiência com a hoasca discretamente no final do espectro quando contrastada

à experiência altamente potente e de ação curta da dimetiltriptamina intravenosa.

Ao passo que a experiência intensa da DMT acaba em menos de trinta minutos, a

experiência total da hoasca dura em média quatro horas. A análise dos dados

revelou que os agrupamentos clínicos do HRS para os examinandos da UDV

estiveram num nível relativamente moderado, quando contrastados com

investigações anteriores dos efeitos da DMT intravenosa (Strassman et al, 1994).

Os agrupamentos de intensidade (1.633 ± 0.533), afeto (0.947 ± 0.229), cognição

(0.908 ± 0.494) e volição (1.309 ± 0.429) foram compatíveis com uma experiência

de DMT intravenosa de dosagem entre 0.1 e 0.2 mg/kg, ao passo que o

agrupamento de percepção (0.484 ± 0.501) foi comparável com uma experiência

intravenosa de DMT de 0.1mg/kg e o agrupamento de cenestesia (0.367 ± 0.256)

foi menor do que o correspondente à dose mais baixa de DMT intravenosa usada

(0.05 mg/kg).

Entrevistas das Histórias de Vida

Todos os 15 examinandos deram informações detalhadas sobre suas

histórias pessoais, com ênfase particular em como o seu envolvimento com a

UDV e a experiência com a hoasca tiveram impacto no curso de suas vidas. Suas

idades abrangiam na época do estudo de 26 a 48 anos, com uma média de 37

anos de idade. Dois deles nasceram dentro da UDV, ao passo que os outros treze

tinham entre 10 e 18 anos de filiação formal à UDV, com uma média de 14 anos

de filiação.Três deles eram mestres atuais (líderes de Núcleos), dois deles eram

filhos de mestres antigos e um era cunhado de um mestre antigo.

Muitos dos examinandos referiram uma variedade de comportamentos

disfuncionais anteriores à sua entrada na UDV. Onze examinandos tinham uma

história de uso moderado a severo de álcool anterior à sua entrada na UDV, com

cinco deles referindo episódios associados com comportamento violento. Dois

deles tinham sido presos por causa de sua violência. Quatro indivíduos também

relataram envolvimento anterior com abuso de drogas, incluindo cocaína e

anfetamina. Oito dos onze examinandos com histórias anteriores de álcool e

abuso de outras drogas, eram viciados em nicotina na época do seu primeiro

encontro com a UDV e o ritual da hoasca. Auto descrições adicionais anteriores à

entrada na seita incluiram “impulsivo... sem respeito.. raivoso... agressivo...

opositor... rebelde... irresponsável... alienado... fracassado”.

Todos os 15 examinandos da UDV referiram que suas experiências com o

uso ritual da hoasca tiveram um profundo impacto no curso de suas vidas. Para

muitos deles o ponto crítico foi sua primeira experiência sob a influência do chá.

Um tema comum era a crença percebida durante o estado alterado induzido de

consciência que eles estavam num caminho auto destrutivo que os conduziria 10

inevitavelmente à sua própria ruína e mesmo à morte, ao menos que

embarcassem numa mudança radical de sua conduta pessoal e orientação.

Alguns exemplos incluiam: “Eu tive uma visão de mim mesmo num carro indo para

uma festa. Teve um terrível acidente e eu podia ver a mim mesmo morrer”... “Eu

estava num parque de diversões, num carrossel, dando voltas e voltas e voltas

sem nunca parar. Eu não sabia como sair de lá. Eu estava muito assustado”... “Eu

podia ver aonde eu estava indo com a vida que eu estava levando...Eu podia me

ver acabando num hospital, numa prisão, num cemitério”... “Eu me vi sendo preso

e levado à prisão. Eles iam me executar por um crime terrível que eu tinha

cometido”. Experimentadores também referiram que nas agonias da experiência

de pesadelos visionários eles encontravam o fundador da UDV, Mestre Gabriel,

que os livrava de seus terrores: “Eu vi esses feios, horrorosos animais. Eles me

atacaram. Meu corpo estava desjuntado, diferentes partes de mim estavam

jogadas por todo o chão. Então eu vi o Mestre. Ele me disse o que eu iria precisar

para por todas as partes de meu corpo de volta no lugar”... “Eu corri pela floresta

horrorizado porque eu ia morrer... Então eu vi o Mestre. Ele olhou para mim. Eu fui

banhado em sua luz. Eu sabia que estaria tudo bem.”... “Eu estava numa canoa,

fora de controle, descendo o rio. Eu achei que iria morrer. Mas então eu vi o

Mestre Gabriel numa canoa bem na minha frente. Eu sabia que enquanto eu

estivesse com o Mestre, eu estaria a salvo”.

Os examinandos referiram que desde sua entrada na UDV suas vidas

passaram por mudanças profundas. Além da total descontinuidade do abuso de

álcool, drogas e cigarros, os sujeitos enfaticamente afirmaram que sua conduta

diária e orientação para o mundo à sua volta, tinham tido radical reestruturação:

“Eu costumava não ligar para ninguém, mas agora eu sei da responsabilidade.

Cada dia eu trabalho para ser um bom pai, um bom marido, um bom amigo, um

bom trabalhador. Eu tento fazer o que posso para ajudar aos outros... Eu aprendi

a ser mais calmo, mais confiante, a aceitar mais os outros...Eu passei por uma

transformação”. Os examinandos enfatizaram a importância de “praticar boas

ações”, prestar atenção no que diz e ter respeito pela natureza. Finalmente,

referiram experimentar melhora na memória e na capacidade de concentração,

estados de humor positivo constantes, satisfação nas suas interações do dia a dia

e um senso de significado e coerência em suas vidas.

Os examinandos inequivocamente atribuiram as mudanças positivas em

suas vidas ao seu envolvimento com a UDV e sua participação no cerimonial de

ingestão do chá. Eles viram a hoasca como um catalizador na sua evolução

psicológica e moral, mas foram precisos em referir, entretanto, que não era

somente a hoasca a responsável, mas antes o fato de beber o chá no contexto da

estrutura ritual da UDV. Muitos dos examinandos foram na verdade bastante

críticos quanto a outros grupos brasileiros que utilizam a hoasca de uma forma

menos controlada e com menos concentração. Examinandos descreveram a UDV

como um “navio” que lhes permite navegar seguramente nos frequentes estados

turbulentos de consciência induzidos pela ingestão da hosca . A UDV é sua “mãe

. . . família . . . casa de amigos”, provendo “orientação e direção”e permitindo a

eles andar no “caminho certo”. Enfatizaram a importância da “união”, das plantas

e das pessoas. Sem a estrutura da UDV, ponderaram os examinandos, as

experiências com a hoasca podem ser imprevisíveis e levar a um senso 11

exagerado do eu. Dentro da “casa da UDV”, entretanto, o estado induzido pela

hoasca é controlado e direcionado no “caminho da simplicidade e humildade” .

DISCUSSÃO

Como esta investigação foi a primeira tentativa de se estudar o fenômeno

da hoasca numa perspectiva biomédica e como o local do estudo era

relativamente primitivo (a Amazônia brasileira), estes resultados precisam ser

vistos como tentativas preliminares. Porém, os achados apresentados são

intrigantes e a um certo grau, inesperados. Avaliações de diagnóstico psiquiátrico,

revelaram que, apesar de uma porcentagem apreciável de usuários de longo

tempo da hoasca terem tido desordens relativas ao álcool, depressivas ou de

ansiedade anteriores à sua iniciação com a hoasca, todas as desordens tinham

remitido sem recaídas depois de sua entrada na UDV. Tal mudança foi

particulamente notada na área de consumo excessivo de álcool, onde além dos

cinco examinandos que tiveram diagnósticos anteriores do CIDI relativos a

desordens por abuso de álcool, seis examinandos adicionais referiram padrões

moderados de consumo de álcool que se aproximavam do status de diagnóstico

psiquiátrico real na entrevista formal estruturada. Todos estes onze examinandos

com envolvimento anterior com álcool, alcançaram a completa abstinência pouco

depois de se filiarem à seita da hoasca. Além disto, foram bastante enfáticos

quanto a transformações radicais no seu comportamento, atitudes em relação aos

outros e visão da vida. Eles estão convictos de que têm sido capazes de eliminar

sua raiva crônica, ressentimento, agressão e alienação, assim como em adquirir

maior auto controle, responsabilidade para com a família e comunidade e

realização pessoal através da participação nas cerimônias da hoasca na UDV.

Embora os efeitos salutares de um forte sistema de suporte em grupo e filiação

religiosa não possam ser minimizados, não é inconcebível que o uso por longo

tempo da hoasca por si mesmo possa ter tido um efeito terapêutico e positivo

direto no status psiquiátrico e funcional dos indivíduos. Análises bioquímicas

anteriores de preparados da hoasca indicaram significativa ação inibidora da

monoamino-oxidase (Mckenna ,1984), o que pode ser relevante para esses

achados clinicos.

A avaliação de personalidade utilisando o Tridimensional Personality

Questionnaire (TPQ) revelou diferenças significativas entre os examinandos da

UDV e os de controle tanto nos domínios do Novelty Seeking como no Harm

Avoidance, mas não no Reward Dependence. Examinandos da UDV pontuaram

siginificativamente abaixo tanto no Novelty Seeking como no Harm Avoidance,

quando comparados com os de controle. Individuos com relativamente baixas

pontuações no Novelty Seeking são descritos na literatura psiquiatrica como

reflexivos, rígidos, leais, estóicos,de temperamento calmo, frugais, ordeiros e

persistentes (Cloninger,1987b). Pontuações baixas no Novelty Seeking também

são associadas a comportamentos de alta desejabilidade social e maturidade

emocional (Cloninger et al ,1991). Indivíduos com pontuações baixas em Harm

Avoidance são descritos como confiantes, descontraidos, otimistas,

despreocupados, desinibidos, amigáveis e enérgicos (Cloninger ,1987b). A 12

assosiação da baixa pontuação no Novelty Seeking e Harm Avoidance foi

identificada com traços de hipertimia, alegria , determinação e confiança elevada

em si mesmo (Cloninger,1987b). Como as dimensões da personalidade medidas

no TPQ são tidas como tendências hereditárias, uma questão pertinente que vem

à tona destes resultados é se os atributos de personalidade medidos aqui foram

influenciados pelo longo tempo de consumo cerimonial da hoasca ou se são

fatores previsíveis especificamente em indivíduos que venham a se envolver num

processo tal como o da UDV.

Um problema similar aparece com a interpretação dos dados

neuropsicológicos. Embora examinandos da UDV tenham tido melhores

resultados no teste neuropsicológico, comparados aos de controle, conforme

medidos no WHO-UCLA Auditory Learning Verbal Memory Test, a falta de dados

retrospectivos torna impossível determinar se o chá hoasca tem proporcionado um

efeito cognitivo benéfico, ou não. Embora os examinandos da UDV tenham

conversado longamente sobre como a hoasca tinha melhorado seus poderes de

concentração e memória, a metodologia atual não foi designada para consolidar

definitivamente esta conexão. Apenas com avaliação comparativa de

performances neuropsicológicas anteriores à primeira experiência com a hoasca,

se poderia obter uma compreensão dos efeitos de longo tempo de uso do chá

sobre o estado cognitivo. Somente administrando tais medições em pessoas sem

experiência anterior com o chá, e depois seguindo-as durante todo o processo,

com avaliações em série à medida em que viessem a se envlover com a UDV e o

ritual de uso da hoasca, poderíamos definitivamente precisar se a hoasca

realmente melhora o status cognitivo. A aproximação metodológica utilizada no

estudo atual pretendeu somente ser preliminar e exploratória, não possuindo a

logística necessária que permitiria tal estudo prospectivo. A presente análise dos

dados é, porém, indicativa de que o consumo por longo tempo da hoasca, no

contexto cerimonial estruturado da UDV, não parece exercer um efeito deletério

nas funções neuropsicológicas.

Este estudo é uma tentativa inicial de aplicar rigorosamente modelos e

instrumentos de pesquisa contemporâneos ao pouco estudado fenômeno do uso

ritualístico da planta alucinógena hoasca. Embora com uma longa tradição de uso

entre as populações indígenas da Bacia Amazônica, aplicação medicinal

amplamente difundida pelas populações mestiças, e, com o desenvolimento no

século XX das igrejas sincréticas no Brasil, pesquisas psiquiátricas e médicas até

agora têm falhado em abordar a questão de quais são os efeitos deste chá

psicoativo incomum. Depoimentos quanto a seus efeitos na melhora e

restauração da saúde precisam ser explorados, assim como alegações de seu

potencial deletério. O estabelecimento de sanção legal dentro do contexto

religioso no Brasil, torna um pré-requisito importante e necessário futuras

investigações objetivas e abrangentes. O uso cerimonial da hoasca, como

estudado neste projeto de pesquisa, é claramente um fenômeno muito diferente

da noção convencional do “abuso de drogas”. De fato, seu aparente impacto

sobre os examinandos avaliados no curso de nossa pesquisa, parece ter sido

positivo e terapêutico, tanto nos depoimentos pessoais como nos testes objetivos.

Existe claramente uma necessidade de buscar estudos de seguimento rigorosos e

abrangentes para as explorações preliminares aqui reportadas, não somente para 13

futura elucidação do fenômeno singular do uso da hoasca num contexto ritual

altamente estruturado, mas também por causa do crescente interesse e uso da

hoasca na América do Norte e Europa. Será imperativo delinear cuidadosamente

o potencial para efeitos adversos assim como estabelecer parâmetros ótimos de

segurança dentro dos quais a hoasca pode ser consumida. Sob esta luz,

cuidadoso estudo da estrutura cerimonial e salvaguarda de tais grupos poderá

facilitar o desenvolvimento de pesquisas futuras. É nossa esperança que esforços

subsequentes para investigar o fenômeno hoasca irão explorar estes assuntos, e

determinar se nossos achados preliminares podem ser confirmados.

Independentemente destes resultados serem finalmente corroborados,

acreditamos ter demonstrado que este fascinante, embora negligenciado

fenômeno, pode ser rigorosamente estudado, utilizando instrumentos de

investigação e pesquisa. 14

TABELA I - TESTE DE PERSONALIDADE EM 15 USUÁRIOS DE LONGO TEMPO DA

HOASCA E 15 INDIVÍDUOS-CONTROLE

Sujeitos Controles t p-valor

Novelty Seeking

NS1: excitabilidade exploratória 3.78+-1.12 5.00+-1.79 -2.08 0.049**

vs. rigidez estóica

NS2: impulsividade vs. reflexão 1.57+-1.34 2.81+-2.27 -1.71 0.100*

NS3: extravagância vs. reserva 3.00+-1.30 3.36.+-1.43 -0.66 0.514

NS4: desordem vs. regimentação 2.00+-1.ll 3.64+-2.01 -2.59 0.016**

NS Total:NS!+NS2+NS3+NS4 10.36+-2.27 14.82+-4.81 -3.07 0.0054**

Harm Avoidance

HA1: preocupação antecipatória 1.21+-1.37 2.36+-1.97 -1.72 0.098*

vs. otimismo desinibido

HA2:medo da incerteza vs.confiança 2.93+-0.73 4.09+-1.87 -2.14 0.043**

HA3: timidez com estranhos vs. 1.93+-1.77 3.27+-1.68 -1.92 0.067**

espírito gregário

HA4: fatigabilidade e astenia 1.93.+-0.92 3.00+-2.45 -1.51 0.144

vs. vigor

HA Total: HA1+HA2+HA3+HA4 8.00+-3.57 12.45+-4.55 -2.75 0.011**

Reward Dependence

RD1: sentimentalismo vs. 4.21+-0.89 3.90+-1.58 0.61 0.547

insensibilidade

RD2:persistência vs. irresolutividade 4.43+-1.74 4.45+-1.86 -0.04 0.972

RD3: fixação vs. desapego 4.71+-1.94 4.27+-2.41 0.51 0.616

RD4: dependência vs. 1.93+-1.21 1.73+-1.62 0.36 0.725

independência

RD Total: RD1+RD2+RD3+RD4 15.29+-2.76 14.36+-3.91 0.69 0.496

15

TABELA II - TESTES NEUROPSICOLÓGICOS EM 15 USUÁRIOS DE LONGO TEMPO

DA HOASCA E 15 INDIVÍDUOS-CONTROLE

WHO-UCLA Auditory Verbal Learning Test

Sujeitos Controles t p

1) palavras recordadas na 5a. 11.21+-1.93 9.50+-2.07 2.19 0.038**

tentativa de aprendizado

2) palavras recordadas após 9.53+-2.72 8.16+-1.99 1.45 0.158

interferência

3) recordação tardia 9.53+-2.64 8.41+-1.62 1.28 0.248

4) número de palavras recordadas 14.33+-0.72 13.75+-1.176 1.17 0.253

5) número de erros falso/positivo 1.06.+-1.10 0.083+-1.19 0.53 0.602

na tarefa de reconhecimento

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